Sábado, 12 de março de 2016
Em
outubro acontecem novas eleições, assim como é feito a cada dois anos no Brasil
desde 1988. O ato de cidadania e dever do eleitor é cumprido também por aqueles
que ainda não são obrigados por lei a comparecer às urnas. Os adolescentes de
16 e 17 podem participam por vontade e estímulos próprios da escolha daqueles
que irão gerir e legislar os municípios, estados e o país. Na Paraíba, no
último pleito federal de 2014, essa faixa do eleitorado atingiu 55.113
votantes, o que representa 1,9% dos eleitores no estado, mas esse número tende
a crescer todos os anos e o interesse dos garotos vai além de votar. Muitos
adolescentes e jovens, desde cedo, querem participar ativamente da vida pública
e da política, ansiando muitas vezes, no futuro, estar no lugar daqueles que
hoje eles apenas podem escolher como seus representantes.
Esses jovens acreditam no papel transformador que têm e reconhecem a função determinante da política na vida dos brasileiros, por isso, eles buscam conhecer o trabalho dos legisladores e gestores e querem participar, não apenas das eleições, mas também da organização de grupos, de protestos e do debate sobre o futuro da saúde, educação, economia e das transformações sociais do país.
O interesse pela política surge da motivação de transformar a sociedade, de acompanhar as eleições que acontecem em suas cidades ou apenas da necessidade de discutir assuntos importantes para a democracia, como conta a estudante de 16 anos Cinthya Casado, que desde cedo descobriu sua vocação para a política. “Sempre gostei de formar opiniões sobre diversos temas polêmicos. No meu último ano do Ensino Médio quando fui convidada para fazer parte do grêmio estudantil da minha escola, não perdi tempo e aceitei imediatamente o convite. A partir daí passei a pesquisar mais sobre a atuação dos jovens na sociedade, qual de fato é o nosso papel e sobre nossa atuação como cidadãos. A fascinação com a atuação dos jovens durante a história política no nosso país foi o que me motivou a ser mais interessada sobre esse assunto”.
Cinthya participou em 2015 do Parlamento Jovem Brasileiro, programa anual promovido pela Câmara dos Deputados, que dá a oportunidade a jovens, entre 16 e 22 anos de escolas públicas ou particulares, de vivenciarem por cinco dias a jornada de trabalho dos deputados federais. Para ela, que detém o mandato de deputada jovem da Paraíba por um ano, a experiência foi única. “A nossa jornada em Brasília foi uma loucura. Trabalhamos literalmente. Divididos em quatro comissões, analisamos e votamos os projetos. Participamos de palestras, consultorias sobre constitucionalidade e adequação financeira. Ter a oportunidade de conhecer de dentro a administração do país foi um momento único”, explica entusiasmada.
Crise traz jovens à discussão
A crise
institucional e econômica instalada no país acendeu o protagonismo da juventude
em grandes mobilizações que tomaram as ruas de diversas cidades do Brasil,
inclusive, João Pessoa e Campina Grande, desde de 2013, quando em São Paulo um
grupo de jovens inconformados com o aumento da passagem do transporte coletivo
ocuparam, em protesto, a Avenida Paulista e outras ruas importantes do centro
econômico do país.
Trabalhando na
Rede Margarida Pró-Criança e Adolescentes, que promove o incentivo da protagonismo
infantil e juvenil até adolescência, Rose Veloso, relata que as crianças e
adolescentes já despertam para a política e sabem que podem e devem cobrar dos
representantes eleitos. “Os políticos são servidores públicos em defesa do bem
comum. Já se perdeu o mito de que eles estão inacessíveis do controle social.
Então, o que percebemos é uma geração mais atenta, que cobra o cumprimento dos
serviços públicos. Há uma mudança de reflexão de algo que parecia distante, mas
eles já descobriram que podem reivindicar. Eles buscam saber o que podem fazer
e a quem reclamar”.
Os jovens
discordam da forma de governar, da economia, da mídia e vão à luta para serem
escutados, sempre na esperança de ajudar a sociedade. “Nosso país está passando
por maus bocados, crise política, mídia tendenciosa e discurso de ódio. Esses
três aspectos se encontram de forma expressiva e que precisam ser modificados,
mas como?”, questiona o universitário José Oliveira de apenas 19 anos.
Ele mesmo dá a
resposta para sua indagação, enxergando os obstáculos que serão encontrados
pela frente para que haja uma verdadeira transformação na democracia
brasileira, mas sem perder a esperança. “Esperar políticos melhores em um
ambiente tomado pelo poder do capital dos empresários é muito difícil, mas a luta
dos brasileiros está se fortalecendo, com universidades e escolas comprometidas
a desenvolver projetos para discussão, debate e pesquisa científica acerca de
problemas políticos são válidos e isso irá se refletir para um futuro melhor,
um futuro com brasileiros comprometidos para lutar pela mudança”, acredita.
Hoje, cursando
Direito no Centro Universitário de João Pessoa (Unipê), José Oliveira, também
participou do programa Parlamento Jovem Brasileiro. Para ele, a corrupção
inverte os valores dos cidadãos e já se instalou no comportamento social dos
brasileiros como “erva daninha”. “É notório aspectos pequenos de corrupção
serem tratados como normais, em momentos onde nós, eu e você, pensamos que não
estamos privando ninguém de um direito, mas estamos. Isso se reflete na
política de forma alarmante, onde temos os nossos representantes confundindo o
público com o privado, não sabendo separar o que realmente é seu e o que não
é”, reflete.
A mesma linha
de raciocínio é seguida pelo estudante Antônio Júnior, de 16 anos. Para ele, os
políticos corruptores devem ser punidos legal e moralmente, mas os pequenos
atos desonestos cometidos por pessoas comuns, como o exemplo simples de tentar
conseguir vantagens em um emprego por ser amigo ou parente do dono da empresa,
também não podem passar em branco e ser considerados “normais”. “Não devemos
culpar apenas os políticos, eles estão errados por roubar o dinheiro público,
mas nós também somos corruptos e, se quisermos que eles não sejam, também
devemos ser corretos e não cometer pequenos atos ilícitos, como furar filas. Se
o povo faz esses pequenos atos ilícitos os políticos serão consequência disso”,
afirma Antônio, completando que a educação é a solução para o combate à
corrupção.
Esperança dos jovens
Nem a crise a
econômica, nem o mar de escândalos de corrupção envolvendo políticos, a exemplo
do mais recente deflagrado pela Polícia Federal, como a operação ‘Lava Jato’, –
que trazem provas que levaram à prisão, por exemplo, do tesoureiro do PT, João
Vaccari Neto – fazem com que esses jovens percam a esperança de encontrar
alternativas para solucionar os problemas do sistema político e institucional
do Brasil.
“Estamos em um
tempo em que não podemos e nem conseguimos confiar nos que se dizem ser
políticos em nosso país. Mesmo alguns dos que se dizem honestos caem no
terrível lema do ‘muito se fala e pouco se faz’. Muitos não têm uma perspectiva
de mudança no cenário político brasileiro. Eu, ao contrário de muitos, acredito
sim que haverá uma mudança, e que ela virá acompanhada dos jovens. Nós que
temos uma sede enorme de progresso, justiça, igualdade e democracia”, diz
Cinthya com confiança.
A coordenadora
do Centro de Apoio Operacional às Promotorias da Criança e do Adolescente do
Ministério Público, promotora Soraya Escorel, entende como positivo o
engajamento dos jovens na política, que, mesmo com pouca experiência de vida,
já demonstram grande maturidade a respeito dos direitos e deveres de todos.
Para ela, a esperança sem medidas não faz dos jovens iludidos, mas sim, planta
neles um sentimento que serve como combustível para trabalhar por melhorias.
“Eu acredito
muito nas pessoas que se interessam pela vida com um todo. Por mais jovens que
sejam, eles querem se aperfeiçoar naquilo que envolve a política, conhecer as
dificuldades públicas, conhecer caminhos para modificar os problemas sociais.
Existem sonhos nesses jovens a serem realizados. Decepções eles vão ter, como
nós todos temos, mas a vontade deles por mudanças com certeza vai fazer a
diferença”, opina.
Nesse contexto,
Antônio pede o engajamento dos jovens como agentes transformadores. “Eu espero
que mais cidadãos venham participar cada vez mais da nossa política. Exercer a
cidadania não é apenas votar, mas participar, buscando fiscalizar o seu
representante, participar de programas que incentivem a política, de protestos
e até você conversar com amigos e familiares sobre a política do país; isso é
exercer cidadania, é ser brasileiro”, dá a receita.
Por dentro do Congresso
Nacional
Antônio Júnior conta que desde de novo
é interessado pela política e no ano passado, assim como, Cinthya Casado e José
Oliveira, teve a experiência no Legislativo, mas em outro programa promovido
pelo Congresso Nacional. Ele participou do Jovem
Senador, um projeto anual do Senado Federal, que
proporciona aos estudantes de até 19 anos, do ensino médio das escolas públicas
estaduais e do Distrito Federal, conhecimento sobre a estrutura e do
funcionamento do Poder Legislativo no Brasil.
O estudante do
terceiro ano do Ensino Médio da Escola Estadual Professor José Soares de
Carvalho, em Guarabira, descreve como os seis dias no Senado enriqueceram o
conhecimento sobre a política e como ele passou a valorizar mais o trabalho dos
parlamentares. “Foi uma experiência importante, pois podemos presenciar como é
a vida do legislador. Conhecemos mais como os senadores e deputados trabalham.
Muitas vezes dizemos que eles não fazem nada, mas é puxado, a gente acha que
não faz muita coisa, mas muitas vezes não conhecemos a atividade do legislador,
não buscamos informações”, pontua.
Nas atividades
no Parlamento, ele conheceu de perto como funciona o trâmite para que um
projeto de lei seja aprovado. Antônio conta que foram formadas três comissões e
cada uma ficou com nove senadores jovens. Ele foi integrante da dos Direitos
Humanos e Constitucionais. O projeto apresentado por ele determina a
disponibilização pela Justiça Eleitoral para estar nos locais de votação para
coleta de assinaturas de projetos de lei de iniciativa popular. “Atualmente
para tramitar no Congresso Nacional, um projeto de iniciativa popular precisa
de mais de um milhão de assinaturas de moradores de pelo menos cinco estados.
Nossa intenção é facilitar o trâmite e no dia em que o eleitor for dar seu
voto, ele também possa ter a opção de conhecer esses projetos e, se concordar,
assinar lá mesmo”, explica.
No Parlamento
Jovem, José Oliveira, explana que, além da troca de conhecimento sobre política
e cultura com pessoas de todo o país, ele pôde “ter a oportunidade de ser
protagonista de todo o processo” democrático. Como o jovem mesmo esclarece,
para participar do programa é necessário preparar um projeto de lei. “A
experiência é marcante e transformadora; a visão do processo político é
totalmente modificada e mais límpida para o leigo no assunto. Nos faz analisar
e cobrar de políticos em momentos de deslize, pois temos conhecimento não só
teórico, mas prático do processo”.
Já pensando
como gente grande, Cinthya Casado dá detalhes de como foi o processo para
participar no Parlamento Jovem: “Eu tive que escrever um projeto de lei. O meu
dispõe sobre a prorrogação do tempo de licença maternidade para casos de
gestação de múltiplos. Os projetos são submetidos a duas etapas, nas quais, no
caso da Paraíba, primeiramente oito são pré-selecionados e finalmente apenas
dois são classificados”.
Os programas
no Congresso credibilizam o trabalho dos jovens e dão a eles voz com poder de
atuação. Sem descartar tudo o que foi produzido, os projetos de leis
apresentados pelos jovens parlamentares, por vezes, chegam aos deputados e
senadores como é o caso do PLS 586/2015, que trata sobre uma nova alternativa
para o ingresso em universidades federais, que inclui no processo de seleção as
notas obtidas pelos estudantes durante o ensino médio A proposta começou a ser
analisada no Senado no início de janeiro e partiu de estudantes que integraram
o programa Jovem Senador.
Além do discurso
Esses jovens
não querem ficar apenas no discurso, mas sim, partir para ação. Eles pretendem,
no futuro, colocar em prática as mudanças que tanto almejam e, para isso,
entrarão, quando permitido por lei, de acordo com a idade, no processo de
disputa eleitoral em busca de um mandato eletivo.
A experiência
no Senado Federal para Antônio foi tão satisfatória, que ele não esconde o
desejo de conquistar no voto o direito de ocupar a cadeira de senador por oito
anos. “Antes mesmo do programa Jovem Senador eu já tinha vontade de disputar
uma eleição. Era um objetivo, agora que eu vi como é fantástico, eu quero ter a
chance de me tornar senador”.
Cinthya, que
antes não tinha interesse em desempenhar um papel de legisladora ou gestora,
conta que mudou de ideia após participar do Parlamento Jovem e pontua os
motivos. “Eu tinha outros planos para minha vida; hoje, posso dizer que há uma
possibilidade. Eu quero poder contribuir para o progresso da nossa nação, eu
quero poder fazer parte da história política brasileira e assim contribuindo
positivamente nas principais decisões desse país”.
José define um
mandato eletivo como um período de entrega total do indivíduo, chegando a ser
considerado por ele como um dom, pois segundo o jovem, o político se abstêm da
vida privada para servir à população. Apesar disso, ele que participa do
movimento social Levante Popular da Juventude, ainda se mostra receoso com o
atual sistema político do país, mas também não descarta o desafio, quando
questionado, de entrar para vida pública. “Não no atual sistema político, mas
já pensei a respeito”.
A promotora
Soraya Escorel vê um movimento contínuo de preocupação dos jovens com os
problemas da sociedade e sede de solucioná-los. Por isso, ela afirma que a
vocação é diferencial para se tornar um bom político. “Quanto mais esses jovens
amadurecem, mais eles querem se aperfeiçoar. Tem pessoas que deixam se
contaminar facilmente, mas existem aqueles que realmente têm vocação para a
política e vão fazer a diferença. Eles têm sonhos, vão atrás, mesmo sendo muito
jovens são cidadãos honrados e querem construir uma história transformadora na
política”, finaliza.
Fonte: Portal Correio
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